Saúde um Direito de Todos

A saúde "é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante a políticas saciais e econômica que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário à ações e serviços para sua promoção, proteção e recumperação." conforme esta garantido e definido no Cap. II Dos Direitos Sociais, Art. 6º e Cap. II Da Seguridade Social, Seção II Da Saúde, Art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Atenção biriteros de platão

Um estudo realizado na Harvard Medical School e publicado na revista Archives of Dermatology avaliou a associação entre o consumo de álcool e o risco de desenvolver psoríase e determinou se esse risco está associado com os diferentes tipos de bebidas alcoólicas. Foram estudadas 82.869 mulheres dos EUA, entre 27 e 44 anos.
Houve 1.150 casos de psoríase incidente, 1.069 dos quais foram utilizados para análise. Comparadas com as mulheres que não bebem álcool, o risco relativo para psoríase foi de 1,72 (IC 95% 1,15 a 2,57) para um consumo de álcool de 2,3 doses / semana ou mais. Quando examinados pelo tipo de bebida alcoólica, havia uma associação entre psoríase e consumo de cerveja (RR para 5 doses / semana, 1,76, IC 95% 1,15 a 2,69), vinho tinto, vinho branco e licor foram não foi significativamente associados com o risco de psoríase. A associação com a ingestão de cerveja se tornou mais forte em um subconjunto dos casos de psoríase confirmada (RR para 5 doses / semana, 2,29 IC 95% 1,36 a 3,85).
Concluiu-se que o consumo de cerveja está associado a um risco aumentado de desenvolvimento de psoríase entre as mulheres. Outras bebidas alcoólicas não aumentaram o risco de psoríase.

Introdução

A psoríase é doença afecção crônica da pele, com fatores de piora ou melhora variados e com importante base genética. Há dois picos de incidência da psoríase, sendo o primeiro antes dos 30 anos e o segundo após os 50 anos. As formas clínicas variam, porém a mais comum é a psoríase vulgar ou em grandes placas. Há ainda as formas pustulosas, eritrodérmicas, palmoplantares, gutatas e outras, cada uma delas com diferentes fatores associados, diferentes tratamentos e diferentes prognósticos.
Uma série de fatores pode exacerbar quadros psoriásicos, dentre os quais podemos citar infecção pelo HIV, uso de corticosteróides orais, traumas, estresses, ingestão de álcool, clima seco, uso de drogas (beta-bloqueadores, lítio, AINES, cloroquina), infecção por estreptococos beta-hemolíticos e outros.

Manifestaççoes Clínica

A forma vulgar é caracterizada por grandes lesões eritematosas e descamativas, pruriginosas, disseminadas e que normalmente poupam a face. Há uma descamação fina e prolongada, e as lesões apresentam os sinais da vela (descamação ao passar o dedo) e do orvalho sangrante (sangramento com descamação mais vigorosa).
Não é comum que pacientes com psoríase vulgar sejam internados, mas em casos de controle muito difícil ou com acometimento extenso é um expediente que pode ser adotado.
A psoríase eritrodérmica é uma forma da doença que determina a internação do paciente. Nela, as placas são substituídas por eritema difuso e descamação, o que pode se dar de forma aguda ou crônica. É comum esse achado após infecção pelo HIV ou uso de corticosteróides, e o paciente deve ser acompanhado com cuidado quanto às medicações a serem utilizadas e ao balanço hidroeletrolítico. O quadro clínico é grave com fadiga, mialgias, anemia e desidratação.
A psoríase pustulosa pode ser generalizada ou localizada. Nas formas localizadas, a pustulose palmoplantar é mais freqüente, com pústulas estéreis nas eminências tenar e hipotenar. A acrodermatite de Hallopeau também é uma manifestação de pústulas nos dedos, mas pode haver destruição e osteólise total nas extremidades. Nas formas generalizadas, quase sempre existe a conotação de doença sistêmica, e nesses pacientes a internação é muito comum.
Há febre, mal-estar, leucocitúria, hipoalbuminemia e hipocalcemia, todos fatores que devem ser avaliados pelo clínico responsável. Um fator que pode levar os doentes a desenvolverem essa forma da doença é o uso maciço de corticosteróides ou antiinflamatórios.
Acometimento ungueal com pitching, onicólise e outros achados são comuns na psoríase e de abordagem mais complexa que a doença cutânea. Também as articulações podem ser acometidas pela psoríase, variando desde quadros leves até quadros deformantes e dolorosos, e nesses casos é fundamental o acompanhamento conjunto com a reumatologia. Trata-se de uma artropatia seronegativa.

Diagnóstico

A psoríase caracteriza-se na histopatologia por ortoceratose, pústulas espongiformes de Kogoj, abscessos de Munro, acantose, ausência de granulosa, espongiose leve, edema das papilas e capilares dilatados. Em geral, o quadro clínico da psoríase clássica não representa maiores dificuldades para o diagnóstico.

Diagnóstico Diferencial

Pode-se afirmar que é necessário pensar em diagnósticos diferenciais para cada forma de psoríase. A forma vulgar em grandes placas costuma ser muito característica. Nas formas eritrodérmicas, é importante pensar em linfomas, pênfigos, farmacodermias e outras doenças que cursam com quadro semelhante. Nas lesões ungueais, o líquen plano deve ser lembrado, podendo-se diferenciar as moléstias pelo acometimento cutâneo simultâneo, se presente, e também pelo exame histopatológico. Formas pustulosas podem ser confundidas com a pustulose exantemática aguda, farmacodermias e buloses.

Tratamento Tópico

Os tratamentos tópicos podem ter sucesso naqueles pacientes com formas leves da moléstia.
Queratolíticos, umectantes, coaltar e antralina são medicações que têm efetividade razoável para psoríase. Lembrar sempre que a vaselina é um excelente hidratante de barreira, disponível para todos os pacientes e a baixo custo.
Os corticosteróides tópicos ainda são os pilares no tratamento tópico da psoríase. Deve-se atentar para a taquifilaxia que ocorre com os corticosteróides, menos evidenciada coma betametasona, além de seus inúmeros efeitos colaterais no uso prolongado e/ou em superfícies extensas (estrias, Cushing, atrofia cutânea e outros).
O calcipotriol, análogo da vitamina D3, tem ação antipsoriásica moderada, com menos efeitos colaterais que os corticóides e com potência moderada. Tem baixa atividade hipercalcêmica, e pode ser associado com praticamente qualquer tratamento oral ou tópico. O calcitriol parece ser ainda menos irritativo que o calcipotriol.
Tacrolimo, pimecrolimo, tazaroteno e 5-fluorouracil são outras drogas com uso ocasional na psoríase. As duas primeiras foram utilizadas recentemente com bons resultados e pouca irritação para lesões do segmento cefálico.
Particularmente em pacientes de enfermaria, os cuidados tópicos assumem um aspecto acessório e devem ser seguidos pelos tratamentos sistêmicos variados.
Os métodos de Ingram (antralina e coaltar + UVB) e Goeckerman (coaltar e UVB) podem ser utilizados com bons resultados, mas costumam ser desagradáveis para os pacientes.

Tratamentos Orais

Estas drogas são reservadas para pacientes com acometimento extenso, sintomas importantes que necessitem resposta terapêutica rápida ou com falhas terapêuticas numerosas que justifiquem a utilização de medicamentos potencialmente tóxicos.
O metotrexato é a droga usada com maior freqüência na psoríase. Antagoniza o ácido fólico e é contra-indicado em crianças, gestantes, hepatites, doença infecciosa em atividade, insuficiência renal, úlcera péptica, leucopenia, plaquetopenia e HIV.
Deve ser usada também com extremo cuidado na vigência de consumo etílico.
A triagem pré-tratamento deve incluir uma radiografia de tórax, hemograma completo, sorologias para hepatites e HIV, e PPD. Exames regulares devem ser solicitados, na expectativa de evidenciar efeitos colaterais severos. O uso diário de ácido fólico é recomendado, e mesmo doses de 5 mg diárias não parecem afetar o sucesso do tratamento.
É muito útil nas formas artropáticas, pustulosas e eritrodérmicas. Pode ser usado com acitretina, ciclosporina, PUVA e UVB. Contudo, particularmente com PUVA, deve-se tomar algumas precauções a fim de evitar efeitos carcinogênicos aditivos.
O uso é seguro até a dose de 1,5 g, quando se deve avaliar a biópsia hepática. A toxicidade hepática é preocupação primordial e é dificilmente abordada por exames bioquímicos ou mesmo imagenológicos, podendo cursar com hepatite e até mesmo cirrose. A dose semanal vai até 30 mg.
A acitretina é um retinóide de segunda geração que veio substituir o etretinato. Como parte da acitretina é convertida em etretinato no organismo, principalmente com a ingestão alcoólica, a gestação é proibida até 2 anos após o tratamento.
Deve ser usada com cautela em doença renal, hepática, diabetes e hiperlipidemia. A dose é variável e há muitos esquemas descritos, seja com doses ascendentes até 70 mg ou com doses descendentes, mas parece haver bom controle da psoríase com até 30 mg/dia de acitretina. É particularmente útil na psoríase pustulosa. Além de descartar gravidez, os exames de triagem e durante o tratamento devem incluir hemograma completo, bioquímica sanguínea, colesterol e triglicerídeos. Para tratamentos muito longos, convém realizar radiografias do esqueleto. É útil também nas formas eritrodérmicas. As terapias que associam os retinóides a UVA (RePuva) ou UVB vêm obtendo cada vez mais aceitação e são alternativas para pacientes com formas graves da doença e para redução da dose do retinóide a ser utilizada.
A ciclosporina é um imunossupressor conhecido e potente, com excelente ação na maioria das formas de psoríase. Não é teratogênica, mas pode gerar fetos prematuros ou com baixo peso.
Deve ser evitada a todo custo em nefropatas ou hipertensos. Imunodeficiências, gota, neoplasias e hepatopatias são contra-indicações relativas. O uso concomitante de antagonistas dos canais de cálcio pode proteger os rins dos efeitos da ciclosporina.
A dose administrada é de até 6 mg/kg/dia, e deve-se preferir os ciclos de 12 semanas, com períodos de descanso entre eles, de forma a minorar os efeitos colaterais. Cefaléia, náuseas, diplopia, mialgia e dispepsia são alguns dos efeitos colaterais associados ao uso da ciclosporina, assim como hipertricose, hiperplasia gengival e distúrbios hidroeletrolíticos. A ciclosporina pode ser iniciada em pacientes com formas clínicas graves da psoríase buscando-se um controle mais rápido da doença, seguindo-se então com o uso da acitretina para controle mais prolongado dos pacientes.
Outras drogas potencialmente úteis na psoríase são a azatioprina, a sulfassalazina e a hidroxiuréia.
A fototerapia é um recurso muito útil para o tratamento da psoríase, e parece ser a terapia com maior prazo de remissão pós-tratamento. A terapia com UVA é usada em conjunto com psoralênico, que deve ser ingerido até 2 horas antes da exposição lumínica. Devem ser tomados cuidados com o cristalino (catarata), neoplasias de pele, queimaduras, prurido excessivo e doenças pioradas pela exposição à luz (lúpus), e os protocolos de doses de manutenção não devem ser extrapolados. O uso de UVB também é útil e conta com menos efeitos colaterais que a PUVA, particularmente o UVB de banda estreita. Os tratamentos com fototerapia têm melhores resultados em pacientes com formas graves de psoríase vulgar, mas, embora apresentem taxas de remissão mais prolongadas que os tratamentos medicamentosos, seu início de ação é mais lento. Não devem ser usados em pacientes eritrodérmicos. Em pacientes internados, essas formas de terapia têm pouca utilidade por esses últimos aspectos.
Novos conceitos no tratamento da psoríase parecem estar se estabelecendo com o surgimento das drogas classificadas como imunoterápicas. Contudo, o alto custo dos tratamentos ainda representa um enorme obstáculo para a quase-totalidade dos doentes.
O alefacept age na ativação e proliferação das células T e deve ser usado na dose de 7,5 mg/semana/IV ou 15 mg/semana/IM, em ciclos de 12 semanas. Os efeitos colaterais são pobres, mas deve-se realizar monitorização do número de linfócitos. Recentemente, casos de linfoma de células T têm sido relatados com o uso prolongado da medicação, o que requer estudos mais cuidadosos para seu uso sistemático.
O etanercept é um recombinante do receptor de TNF alfa. É usado na dose de 25 mg duas vezes por semana. Tem sido estudado em conjunto com o metotrexato, com bons efeitos no controle da doença.
O efazulimab e o infliximab são anticorpos monoclonais em estudo para tratamento da psoríase, com boas perspectivas até agora. O efazulimab age contra receptores CD11a e é administrado na dose de 2 mg/kg/semana, 12 semanas. Efeitos colaterais como náuseas, febre e calafrios tendem a involuir com o tratamento. Já o infliximab bloqueia a ação do TNF alfa (anticorpo quimérico humanizado), sendo eficaz para psoríase na dose de 10 mg/kg, endovenoso, com 0,2 e 6 semanas. O infliximab aguarda maior sistematização para uso em psoríase, muito embora já seja usado em alguns pacientes selecionados e já esteja liberado para artrite reumatóide e doença inflamatória intestinal. Prurido, reações no local da injeção, cefaléia e agravamento de distúrbios cardíacos são alguns dos achados possíveis com infliximab. A infusão é realizada em 2 horas, e pode-se reaplicar após 16 semanas da última dose, dependendo da reativação da doença.

Fonte:
01 - Archives of Dermatology, Volume 146, Number 12, 2011, Pages 1364-1369
02 - Blibliomede: Guia de Dermatologia Hospitalar - Capítulo 14 - Psoríase

domingo, 20 de março de 2011

Síndrome de Werner

A Síndrome de Werner é uma alteração autossômica recessiva gerada por uma mutação no gene WRN, que codifica uma helicase de DNA. Estudos recentes indicam que a expressão da telomerase (enzima descoberta por Elizabeth Blackburn e Carol Greider em 1985, que tem como função adicionar sequências específicas e repetitivas de DNA à extremidade 3' dos cromossomos, onde se encontra o telômero) poderia constituir no futuro uma alternativa terapêutica.

Histórico

A mutação responsável pela síndrome de Werner foi localizada em 1992 no cromossomo 8 pelo grupo de trabalho de Dennis Dryna, e em 1996 o grupo dirigido por Chang-En Yu da Universidade de Washington identificou e clonou o gene afetado (WRN). O estudo de seqüência do WRN em diferentes pacientes confirmou a presença de mutações situadas ao longo da região codificadora. Em todos os casos tratou-se da criação de códons de parada ou mudanças no local de início de transcrição, gerando produtos truncados.

O WRN codifica uma proteína de 1.432 aminoácidos comumente localizadas no nucléolo, homólogas às DNA helicases da família RecQ, sendo então denominadas de RecQL3. Estas enzimas estão implicadas no processo de desdobramento da dupla hélice de DNA durante a replicação, nos mecanismos de reparação do DNA e na segregação dos cromossomos.

Manifestação Clinica

A síndrome de Werner é uma doença de origem genética cujos sintomas coincidem com aqueles observados em pessoas de idade avançada, podendo também ser denominada de "Síndrome do envelhecimento precoce".

As principais manifestações que caracterizam esta doença são:

• Alterações na pele (muito marcada nas extremidades)

• Calcificações subcutâneas

• Arteriosclerose prematura

• Catarata

• Diabetes mellitus.

Os primeiros sintomas desta alteração aparecem a partir da puberdade, mas a manifestação completa da síndrome ocorre no começo da 3ª e 4ª décadas de vida (20 a 30 anos). Embora as doenças associadas coincidam com as que surgem em pessoas de idade avançada, sua forma de apresentação não é exatamente a mesma. Por exemplo podemos tomar o caso da osteoporose, ambos grupos podem desenvolvê-la, mas, a distribuição dos locais mais acometidos é bastante diferente. Mas além das diferenças com o processo de envelhecimento natural e que a incidência desta doença seja relativamente baixa, seu estudo adquire particular importância devido à identificação dos genes envolvidos e aos mecanismos que levam ao surgimento dos sintomas, poderem contribuir de maneira significativa no processo de compreensão de importantes doenças que se apresentam na velhice.
Esta doença é autossômica recessiva, sendo necessário duas cópias defeituosas do gene envolvido, isto ocorre com uma freqüência estimada entre 1 e 10 indivíduos por 1.000.000 e muitos dos casos relatados apresentam parentesco entre os pais.

A análise do cariótipo de linhagens celulares provenientes de fibroblastos de pacientes com esta síndrome apresenta diversidade clonal, gerada principalmente por translocações. Têm-se observado também estruturas cromossômicas anormais, baixa resposta a agentes mitogênicos e uma elevada freqüência de mutações, predominantemente deleções geradas por recombinações não homólogas.

Os fibroblastos normais, quando são cultivados in vitro, duplicam-se por um número limitado de vezes, entrando então em um estado denominado senescência. Este processo é regulado pelo encurtamento dos telômeros e caracteriza-se pela ausência de divisão celular. Ao cultivar fibroblastos (WS) provenientes de pacientes com síndrome de Werner observou-se que estes apresentam uma redução significativa no número de duplicações apresentadas antes da entrada no estado de senescência. Os fibroblastos normais se duplicam cerca de sessenta vezes antes de entrar no estado de senescências, mas os fibroblastos WS entram no estado de senescência com cerca de vinte duplicações. Uma vez que o WRN codifica uma proteína envolvida na reparação do DNA, pensou-se, como hipótese, que a diminuição no número de duplicações dos fibroblastos WS era devido ao acúmulo de danos no DNA e não no encurtamento do tamanho dos telômeros como ocorre nos fibroblastos normais. Sabendo que a entrada no estado de senescência dos fibroblastos normais pode ser postergado por meio da expressão do gene hTRT. D Kipling e R Farangher, com seus respectivos grupos de trabalho, investigaram se ocorria o mesmo em fibroblastos WS. Utilizando retrovírus como vetores eles expressaram a sub-unidade catalítica da telomerase humana (hTRT) em fibroblastos WS e observaram que existia um atraso na entrada do período de senescência. A partir destes resultados, os autores sugerem que as conseqüências das mutações no WRN seriam a aceleração da senescência replicativa controlada pelo encurtamento dos telômeros. Estes resultados mostram que a expressão da telomerase é suficiente para prevenir a senescência prematura em células WS e inclusive permite estabelecer linhagens de "células imortais", ampliando as possibilidades para o desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas.

Fonte: Bibliomed e wikipedia.

Saúde Publica: Tinido

Introdução


O tinido é uma percepção de som na ausência de estímulo acústico externo e representa uma queixa médica comum que possui múltiplas causas. O chamado tinido objetivo caracteriza-se pela percepção de sons originários de vibração do fluxo sanguíneo, mioclônus ou contrações musculares, entre outros. Esse subtipo é raro e não será abordado nesse artigo. O tinido subjetivo é o subtipo mais prevalente e estima-se que afete cerca de 600 milhões de indivíduos em todo o mundo, com uma prevalência de 12-15% entre os adultos.
Na maioria dos casos, os pacientes apresentam perda auditiva concomitante, o que se acredita ser relacionado à idade, já que a maioria dos pacientes que queixam-se de tinido encontram-se na faixa entre 40-70 anos. O tinido tende a afetar mais comumente os homens que as mulheres, e alguns dados sugerem que sua prevalência é maior entre os brancos do que os negros.

Etiologia

O mecanismo comum do tinido ainda não foi completamente elucidado, de forma que existem diversas teorias que tentam explicar sua ocorrência. A produção do som na ausência de um estímulo acústico externo parece originar-se de uma atividade neural anormal que surge em algum ponto da via auditiva, desde o aparato coclear até o córtex auditivo. Assim, células com descarga irregular, fibras nervosas hiperativas ou falta de supressão no córtex auditivo sobre a atividade nervosa periférica poderiam estar envolvidas.
Doenças otológicas são causas comuns de tinido, e essa condição tem sido associada à exposição a ruídos, perda auditiva induzida por ruído, presbiacusia, otosclerose, otite, impactação de cerúmen, doença de Ménière e perda auditiva sensorioneural. Causas neurológicas incluem Schwanomas vestibulares, esclerose múltipla e traumatismo craniano. O tinido é um dos três principais sintomas associados aos Schwanomas vestibulares. O tinido também pode ser iatrogênico, derivando-se de complicações cirúrgicas ou de efeitos adversos de medicações como salicilatos, anti-inflamatórios não-esteroidais, diuréticos de alça, quimioterápicos e opiáceos. Alguns distúrbios metabólicos que podem causar tinido são deficiência de vitamina B12, de zinco, anemia e hiper/hipotireoidismo. Vale ressaltar que o tinido já foi observado em uma parcela significativa de pacientes com depressão.

Inicialmente, acreditava-se que o tinido surgia de perda auditiva ou lesão coclear, mas alguns estudos foram contrários a essa hipótese. No entanto, dados posteriores mostraram que o tinido se relaciona fortemente a perda auditiva na mesma frequência.

Avaliação do Paciente com Queixa de Tinido

O primeiro passo na avaliação do paciente com queixa de tinido consiste na obtenção de anamnese completa e exame físico cuidadoso, permitindo a diferenciação inicial entre tinido objetivo e subjetivo, bem como a identificação de possíveis causas tratáveis como efeitos adversos de medicamentos. Deve-se pesquisar o início do sintoma, localização, características do som, sintomas associados, exposições e fatores de exacerbação/alívio. A pesquisa da história médica prévia inclui achados de causas que possam ter contribuído para o sintoma, como hiperlipidemia, distúrbios tireoideanos, anemia, deficiências metabólicas e cirurgias otológicas.
Os pacientes podem queixar-se de sintomas unilaterais ou bilaterais, e o tinido é frequentemente descrito como zumbido, semelhante ao som de grilos, assobio, sussurro. Um ponto importante é definir se o tinido afeta a qualidade de vida do paciente, pois esse parâmetro terá importância fundamental na decisão terapêutica. Para esse objetivo, existem dois questionários validados: o Tinnitus Severity Index (TSI) e o Tinnitus Handicap Inventory (THI).

O exame clínico tem como foco a região da cabeça e pescoço, com atenção especial para o canal auditivo externo, a membrana timpânica, a cavidade oral e a articulação têmporomandibular. Devem-se testar os pares cranianos, principalmente o quinto, o sétimo e o oitavo. A ausculta das carótidas, da mastoide e das áreas periaurais é essencial; o tinido de origem no fluxo venoso pode ser suprimido por meio da compressão da veia jugular ipsilateral.

O próximo passo é o teste audiológico, incluindo teste de limiares para tons puros com condução aérea e óssea, medidas de impedância acústica com timpanometria e limiares de reflexo acústico, audiometria de fala e testes de mascaramento. Quando há a suspeita de Schwanoma, como na presença de perda auditiva unilateral para alta frequência combinada a baixa discriminação da fala, testes adicionais (exames de imagem) são recomendados.

Tratamento

Atualmente não existe uma terapia curativa única para o tinido, nem medicações aprovadas. Além disso, uma revisão de estudos randomizados mostrou que não existe terapia superior ao placebo em termos de alívio a longo prazo. Porém, algumas modalidades fornecem alívio dos sintomas, mesmo que em grau parcial.
O primeiro passo no tratamento envolve a mudança no estudo de vida, sendo seguido do emprego de suplementos e algumas medicações. Caso não haja resposta, pode-se lançar mão de treinamento, Neuromonics, dispositivos auxiliares para audição e de mascaramento. Uma terapia emergente trata-se da estimulação magnética transcraniana, que ainda é considerada experimental. Em casos mais graves, é comum que todas essas abordagens falhem; nesses casos, pode-se oferecer ao paciente a psicoterapia e terapias alternativas, como a acupuntura.

1. Modificações no Estilo de Vida

Trata-se do primeiro passo no tratamento e envolve o aconselhamento para a eliminação de certas substâncias na dieta, como sal, cafeína, álcool, açúcares simples, aspartame e corantes alimentares. Nos casos mais leves, essas medidas podem ser benéficas, porém nos casos mais graves o benefício provavelmente é pequeno.

2. Suplementos e Medicações

Diversos medicamentos provaram benefício no alívio dos sintomas de tinido, e os mais empregados são os benzodiazepínicos, antidepressivos, anticonvulsivantes e agentes antiglutamatérgicos. Em alguns estudos, os benzodiazepínicos mostraram algum benefício, mas esses achados não foram reproduzidos em todos os estudos. Como exemplo, um estudo que avaliou o uso do alprazolan mostrou que houve redução de 65% na intensidade do tinido, em comparação a 5% de redução no grupo controle.

Entre os antidepressivos, vários agentes já foram estudados. A amitriptilina demonstrou ser benéfica na redução das queixas de tinido, quando comparada ao placebo, após um período de seis semanas. Estudos com inibidores seletivos da receptação de serotonina não conseguiram mostrar resultados favoráveis. A mesma coisa pode ser observada em relação aos anticonvulsivantes, como a carbamazepina e a gabapentina. Agentes antiglutamatérgicos, como a memantina, também foram tentados, também com resultados desapontantes.

Diversos estudos analisaram o emprego de suplementos, como o ginkgo biloba. Em duas revisões da literatura, foram encontrados estudos mostrando efeito benéfico da suplementação com ginkgo biloba, porém uma revisão sistemática conduzida pela equipe da Biblioteca Cochrane não conseguiu mostrar benefício. Outros suplementos que podem ter algum benefício são as vitaminas do complexo B. A deficiência desses nutrientes já foi implicada no tinido, mas ainda não foram publicados estudos clínicos avaliando seu benefício no tratamento dessa condição.

3. Treinamento e Terapias de Mascaramento

A terapia de treinamento baseia-se em evidências neurofisiológicas de que as pessoas podem-se habituar a estímulos acústicos no seu ambiente. Assim, essa modalidade envolve o aconselhamento diretivo e terapia sonora na forma de dispositivos que emitem sons de baixa intensidade, de forma que não interferem com a audição. Os dados já publicados mostram melhora de até 80% no sintoma.
A terapia de mascaramento também já demonstrou benefício e envolve a aplicação de um som de baixo nível para mascarar o som subjetivo do tinido. Em um estudo que comparou diretamente as duas terapias mostrou que a terapia de mascaramento foi superior ao treinamento, em relação aos resultados a curto prazo (3 meses), mas a segunda mostrou melhores resultados após 12-18 meses.
O Neuromonics é um programa de tratamento com duração de seis meses que emprega um sinal acústico que mascara intermitentemente a percepção do tinido pelo paciente. Parece ser benéfico e já mostrou melhorar os sintomas em um período de 12 meses.

4. Estimulação Magnética Transcraniana

A estimulação magnética transcraniana (EMTC) emergiu recentemente como potencial alternativa no tratamento do tinido. Ela induz estimulação elétrica de neurônios corticais pela criação de um campo magnético breve e focal na superfície cerebral. Quando os pulsos magnéticos são realizados repetitivamente e ritmicamente, o processo é chamado de EMTC repetitiva. O campo magnético é breve (microssegundos), relativamente fraco, e declina rapidamente à medida que se afasta do gerador.
Na maioria dos estudos, a EMTC repetitiva foi realizada com pulsos de baixa frequência, aplicados a um dos lobos temporais por 30 minutos, uma vez ao dia, por 3-10 dias consecutivos. Independente da técnica usada, resultados benéficos são obtidos em até 50% dos pacientes. Embora o efeito do tratamento dure apenas seis meses em alguns casos, a maioria dos estudos não conseguiu demonstrar supressão a longo prazo do tinido, sendo que os efeitos duraram apenas horas a dias. Para melhorar esses resultados, outros estudos ainda estão em andamento, na tentativa de compreender melhor os parâmetros mais adequados para sua utilização.

Fonte: Bibliomed

quinta-feira, 10 de março de 2011

Avanços recentes no tratamento das cefaléias

Nos últimos anos, foram feitos avanços importantes no tratamento das cefaléias idiopáticas. Novos estudos foram publicados abordando as terapias medicamentosas ou não, indicadas no tratamento agudo ou profilático. Além disso, novas entidades foram descritas pela Sociedade Internacional de Cefaléia (SIC), para as quais recomendações podem ser dadas. Stefan Evers e colaboradores publicaram recentemente uma revisão sobre os avanços no tratamento das cefaléias.
Os triptanos e os antiinflamatórios não-esteróides continuam sendo as drogas de escolha para o tratamento das crises de enxaqueca. Estudos recentes mostraram que o tratamento precoce é eficaz e que o uso dos triptanos pode ser benéfico. Novas drogas, com novos mecanismos de ação, estão sendo desenvolvidas, como o antagonista do peptídeo relacionado ao gene da calcitonina. Para a profilaxia da enxaqueca, o topiramato tem sido uma droga eficaz. A toxina botulínica não mostrou-se eficaz no tratamento da enxaqueca e da cefaléia tensional. Para a enxaqueca e a cefaléia em cluster, procedimentos cirúrgicos como a oclusão do forame oval patente e a neuroestimulação do hipotálamo, respectivamente, estão em avaliação. Um grupo de cefaléias miscelânea (grupo 4 da SIC) também foi descrito, para o qual o uso da indometacina pode ser recomendado, de acordo com estudos controlados por placebo.
Avanços recentes no tratamento das cefaléias compreendem evidências crescentes da administração apropriada de medicamentos e para a terapia diferencial, em preferência ao desenvolvimento de novas drogas ou procedimentos. Procedimentos cirúrgicos e outros não-medicamentosos estão em discussão e podem representar uma ferramenta adicional nos próximos anos.

Fonte: Current Opinion in Anaesthesiology 2005;18(5):563-568

Riscos ocupacionais relacionados à anestesia

Com o objetivo de avaliar os riscos ocupacionais relacionados à prática da anestesia e fornecer medidas preventivas em relação às mesmas, Mérat e colaboradores, da Escola de Val-de-Grâce, França, realizaram revisão da literatura publicada recentemente.
Foram pesquisados os bancos de dados MEDLINE e do Regional Case Disease no "Île-de-France". As palavras-chave empregadas foram: anestesia, riscos ocupacionais, gás anestésico, condições de trabalho, estresse, burnout, adição, exposição ocupacional a sangue, alergia ao látex, radiação ionizante, eletrocussão e explosão. Foram selecionadas revisões gerais e artigos originais, além de casos clínicos isolados e cartas ao editor.
Existem diversos riscos ocupacionais relacionados à prática da anestesia. A toxicidade dos gases anestésicos, particularmente do óxido nitroso, foi realçada logo no início de seu uso. O uso da maioria dos gases tóxicos foi abandonado e a aplicação de medidas coletivas de proteção (sistema de evacuação do gás, ventilação das salas de cirurgia, uso de circuitos fechados para anestesia) tornou possível reduzir consideravelmente o risco relacionado à inalação anestésica. A exposição ao sangue também foi reduzida, graças à melhor observação de regras de segurança e uso de material protegido. O risco de alergia ao látex reduziu consideravelmente, após a substituição do látex por outros materiais. O risco relacionado à exposição a radiação ionizante é melhor controlado, já que regulação bastante estrita foi implementada. A sala de cirurgia envolve riscos de eletrificação, queimaduras e explosão. Novos riscos foram identificados: adição a drogas e o burnout. Sua freqüência é de difícil avaliação, mas esses riscos podem ter sérias conseqüências para os pacientes e anestesistas. Sua prevenção baseia-se na melhoria das condições de trabalho e de um melhor reconhecimento profissional.
A toxicidade dos gases anestésicos, exposição a hemoderivados e a radiação ionizante, alergia ao látex, eletrificação e o risco de explosão na sala de cirurgia são riscos profissionais bem identificáveis para o anestesista. Medidas foram implementadas para reduzir sua incidência. Dois riscos são cada vez mais reconhecidos: a adição a drogas e o burnout. A melhoria das condições de trabalho e o melhor reconhecimento profissional são as maneiras mais adequadas de prevenir tais riscos.